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terça-feira, 30 agosto 2022 19:18

Xivendze ou Ku khexa: a maldição pelo desrespeito ao Luto  

fotografia meramente ilustrativa fotografia meramente ilustrativa

Nas sociedades africanas, quando um indivíduo morre, os familiares obedecem um período que compreende desde a morte, passando pela sepultura até a purificação ou Ku Phuphutsa – um ritual que encerra o "período quente".

Este período é caracterizado por ku yila – onde todos presentes na casa do finado obedecem restrições e ficam confinados na casa "dos falecimentos", abstêm-se de sexo, bebida, e outras situações que contrariem o estado de tristeza. Geralmente, o luto dura entre cinco a sete dias.

Igualmente, os moradores da aldeia onde ocorrera o infortúnio ficam privados das suas actividades principais, como ir a machamba.

Os aldeões ficam igualmente privados de ambientes festivos, em homenagem ao falecido. Este período de luto (Ku yila) ou (xi mussi), termina com um ritual de purificação – ku Phuphutsa. É aqui onde os familiares que estiveram a acompanhar o luto na casa do falecido são liberados a continuar com as suas actividades normais.

"Ku Phuphutsa" é o ritual feito para marcar o fim do tempo de "Ku yila" ou luto. Consiste na purificação da casa, incluindo as pessoas, os utensílios, animais, árvores etc. Este procedimento autoriza os familiares a manipular os bens do falecido.

Os bens como a roupa, utensílios, animais e outros, começam a ser usados. Porém, o cônjuge (viúva ou viúvo) da pessoa falecida, leva um ano para "tirar o luto" e decidir um novo relacionamento. No caso da viúva, o irmão mais novo do falecido é quem toma-a como esposa –  ku "lhambela tsomba", ou Kutchinga

No dia da purificação, o "Nhanga" (médico tradicional), prepara um remédio específico baseado em "makabyiyili", caule ou "xibo" seco que deve ser encontrado no meio do caminho. Depois de ser queimado e transformado em carvão, este caule é esmagado e tornado em pó. É este pó que se mistura com "xima" em preparação, que depois é servida pelos elementos da família presentes, e que tenham vivenciado tudo desde o falecimento do ente-querido.

De acordo com a tradição, a violação das normas estabelecidas no tempo de ku yila ou xi kuma (período de luto), resulta em uma série de complicações que vão desde azares, doenças e até a morte.

Mexer nos pertences do falecido antes da purificação, significa uma horrível maldição que origina uma doença cuja manifestação se parece com tuberculose. Uma tosse aguda com escarro de sangue que leva o indivíduo prevaricador à morte. Chama-se xivendze ou ku khexa, em língua Citswa.

Está explicação tivemos da avó Suluwane, uma anciã de 67 anos, residente na localidade de Chirruala no distrito de Vilankulo e detentora de um conhecimento profundo das normas sociais e culturais locais.

“Pode contrair este problema aquele que usar ou beneficiar-se dos bens do malogrado antes da purificação. Igualmente, pode "khexar" aquele que toma o cônjuge do indivíduo falecido antes de Ku Phuphutsa”, explica a vovó Suluwane.

A nossa entrevistada acrescenta que  as maiores vítimas de kxivenu khexa são os indivíduos de sexo masculino, devido ao processo de "Ku lhambela tsomba" (tomada da mulher do falecido irmão). Ela explicou que xivendze pode levar a morte do indivíduo se este não se confessar e encontrar o tratamento adequado.

Para evitar atropelos à norma de ku yila, um ancião da família tem o dever de explicar a todos, incluindo crianças, para que ninguém caia inocentemente neste problema.

Xivendze é uma problemática muitas vezes confundida com tuberculose, porém, a medicina convencional não é capaz de curar, esclarece a nossa fonte.

Os primeiros sinais de que o indivíduo está perante uma situação de xivendze  são calafrios, falta de apetite, perda de peso e tosse seca. Só mais tarde é que o indivíduo desenvolve tosse com escarro de sangue. Nesta fase, a possibilidade de recuperação é quase nula.

A nossa fonte explicou que a xivendze  tem cura, porém, o indivíduo em causa, uma vez ter infringido as normas no período de luto, deve comunicar aos anciãos, os primeiros sinais desta "maldição". Um ancião entendido na matéria encarrega-se de entender as reais circunstâncias em que o indivíduo contraiu o problema. O doente deverá confessar detalhadamente o sucedido, para que os anciões lhe concedam o perdão – que é indispensável para que o remédio surta os efeitos desejados. Só depois da confissão é que começa o tratamento, que obedece duas linhas. A primeira linha consiste na ingestão de "ti sinha", uma combinação de raízes mergulhadas em uma garrafa. Entre as raízes consta "xibinhani" e raiz de xexenga, conhecidas por seu alto poder de anular o azar e inibir a acção de espíritos maus.

Uma vez mergulhadas em carrada de água, o suco combinado destas raízes é administrado ao doente em forma de doses, principalmente à hora das refeições principais.

A segunda linha de tratamento de xivendze ou ma khexwa consiste em queimar estas mesmas raízes, esmagá-las e administrar ao doente, colocando uma colherinha na xima preparada para o doente. Às plantas queimadas e esmagadas, pode ser adicionada a água do banho do doente, acompanhando o banho com dizeres que se refiram aos erros cometidos durante o período de ku yila.

Este tratamento pode durar no máximo um ano até que o indivíduo fique completamente recuperado.

A nossa fonte afiançou que indivíduos de qualquer idade podem contrair ma khexwa, pela simples razão de manipular bens relacionados ao falecido, antes da purificação – ku phuphutsa.

Escrito por Amadeu Quehá para Tsevele

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